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Entrevista- Negodai : a música como porta-voz do povo




Dedicação - O artista brasiliense  usa sua música como porta-voz de seus sentimentos e como meio de denúncia social
Foto: Reprodução Instagram



Todos os dias ela se levantava com uma missão comum a 86 % das mulheres brasileiras: lavar as louças do café ou encostar a barriga no tanque e com muito zelo esfregar as peças de roupas de todos da família. A torneira aberta e o barulho da água davam o ritmo para a  mulher, que tinha ali na sua frente no estourar das bolhas de sabão e a percussão feita pela escova a melodia perfeita para soltar sua voz grave que invadia o pequeno barraco de madeira e encantava o menino que despertava com o belo cantar da mãe.
Essa foi o primeiro contato que o cantor e compositor brasiliense, da cidade Gama, Adailton de Souza Miranda ou o Negodai, de 47 anos teve com a música em sua vida. Daí em diante aprendeu nos bancos escolares as primeiras canções, e depois na adolescência integrou a banda de sua igreja. 
Anos mais tarde sentiu a necessidade de expressar tudo aquilo que sentia em forma de arte. Foi quando começou a compor e escreveu  canções como " Uma parte de Mim" na qual fala que também tem voz",  e que pode ser conferida em seu canal do Youtube. É neste canal e em seu Instagram @negodai3  que o cantor divulga seu trabalho como músico.
Mas para conseguir gravar suas canções Negodai passou por diversos percalços e sentiu na pele as dificuldades de muitos artistas independentes em busca da realização de seus sonhos: cortou gastos extras e chegou a trocar carne das refeições  por linguiça e ovo, para conseguir verba e ter suas músicas gravadas em um estúdio.
Conheçam no Falando em Sol de hoje uma verdadeira história de amor à arte.
Com vocês, Negodai


F.S- Quais são suas primeiras memórias de vida envolvendo música?

Minhas primeiras memórias de vida envolvendo música vem da minha mãe. Morávamos em barraco de madeira pequeno, pela manhã, quando ela lavava a louça ou a roupa da casa, ela cantarolava durante a execução do trabalho. Era lindo a sensação daquele grave tomando conta do quarto, eu ainda deitado, pois era muito cedo ainda, chegando aos meus ouvidos
 
F.S- Como começou a tocar? E a compor?

 Acredito que comecei a cantar na escola,  aquelas canções que os professores ensinavam para as crianças,  às músicas não saiam da minha cabeça,  era fascinante,  eu ficava repetindo as canções quando chegava em casa. Quando adolescente, cantei em uma banda na igreja. A música sempre fez parte da minha vida. A composição veio mais tarde,  sentia a necessidade de expressar meus sentimentos,  de comunicar  como eu interpretava a realidade ao meu redor. Violão,  eu não toco,  apenas arranho rsrs, mas aprendi um pouco, em apresentações,  sempre procuro alguém para me acompanhar. Comecei aprender violão com aquelas revistas de cifras,  depois quando tive condições,  procurei alguns professores para aprender um pouco sobre teoria e saber o que era aquilo que eu tocava. Mas, sempre minha atenção maior foi para o canto. Sentia necessidade de aprender técnica Vocal para evoluir,  bom,  aprendi um pouco.

F.S -  Quem são suas referências musicais?

 Olha, gosto de vários estilos musicais, A MPB é muito rica, então tenho vários influenciadores. Mas, destacam-se Lenine, Djavan, Céu, Maria Betânia, Tim Maia, Jorge Ben Jor, Cazuza e Renato Russo.

F.S- Nesses anos todos de estrada teve alguma história que te marcou como artista?

Tiveram várias histórias marcantes. Mas, nenhuma como a gravação do meu álbum Uma Parte de mim. Foi incrível essa experiência. Eu precisava, primeiro, achar qual era a sonoridade que eu queria, e depois precisava encontrar alguém que entendesse e desse vida a esse som. Eu nunca tinha gravado nada em estúdio, e até então, nunca tive o compromisso de definir qual era o meu som. Quando me dei conta disso tive que me definir, saber o que eu realmente era enquanto músico e a linguagem sonora que me representava. Essa busca marcou minha vida artística e trouxe vários aprendizados. Fui me descobrindo, isso é muito difícil, eu nunca achava que a música estivesse pronta e depois eu não tinha muito dinheiro, não podia perder muito tempo em horas de estudo. Comecei a fazer a pré produção, e aí, a realidade mexeu comigo. Para fazer o som que eu queria tive que me privar de muita coisa. Minhas composições precisavam ganhar a vida da forma como estavam na minha cabeça.
Para conseguir isso,  tive que economizar bastante. Eu não comprava roupa,  nem tênis.  Evitava sair para não gastar. Foquei no meu objetivo  e fui cortando um monte de coisa. Teve uma vez que eu não aguentava mais comer só linguiça e ovo,  estava doido para comer carne (rs). Aí, trabalhei a minha mente,  comia linguiça e ovo saboreando como se fosse carne (rs).

F.S - Qual teu maior sonho ?

Meu maior sonho é obter o reconhecimento do meu trabalho. Mostrar minha música para um público maior que goste do meu trabalho.

F.S- O que é a música para você? É uma forma de resistência?

 A música é um terreno sagrado. Onde eu entrego os meus sentimentos, minha forma de ver o mundo. Nela estão presentes os elementos que formam minha subjetividade e minha necessidade de comunicação. A música me conduz a outros eus, tirando a limitação que a realidade me impõe. Minha composição ora é uma denúncia da realidade social,  ora é uma fala dos sentimentos que agonizam a alma. Então, sim, é uma forma de resistência.


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