Em busca de alguns vídeos na casa de meus pais me deparei com minha primeira audição de piano. Engraçado que sempre fui comigo mesma mais crítica do que com as outras pessoas. Na época não achava que sabia muito. E qualquer erro me deixava irritadíssima a ponto de começar a tocar de novo, e de novo, e de novo até conseguir tocar a canção toda.
Eu não tinha um piano em casa mas tocava num órgão que meu pai vendo minha empolgação e de minha irmã numa loja de móveis usados comprou e nos deu para que pudéssemos praticar. Minha irmã não quis dar continuidade às aulas de piano mas eu adorava. Minha professora morava na esquina da minha casa num sobrado em cima de um bar, e as janelas viviam abertas para a rua. Quando voltava da escola ou da padaria ou de onde quer que fosse passava devagarzinho para ouvir o som que saia para a rua.
E passava as tardes nas quais não tinha aulas de inglês ou provas da escola praticando o que aprendia. Mas eu me achava muito "sabichona" porque tinha uma facilidade em tirar a melodia "de ouvido" na clave de sol.Na de fá que era a escala ao contrário não tinha tanta familiaridade o que me forçava seguir religiosamente a partitura.
E embora a gente "ache" que tenha facilidade em algo ou seja conhecedor em um assunto é um ledo engano : a clave de sol por várias vezes me acusava de não ter estudado a partitura, pois a professora acompanhava a execução e via quando eu tocava uma nota a mais ou a deixava de tocar, ficando assim nítido que eu tinha tirado por minha conta. Minha relação com o Sol era de amor e ódio: me dava a liberdade mas por me deixar solta demais me fazia questionar minha real capacidade.
Mas eu achava que não tocava o suficiente, como sempre minha autocrítica me punindo. E semana passada ao rever o vídeo percebi que para uma iniciante eu tocava bem. Mas o que me deixou mais impressionada ainda foi ver meus olhos cheios de água ao assistir a apresentação de uma colega que tinha passado por várias cirurgias (por ter nascido com lábio leporino) que maravilhosamente tocou "Ballade Pour Adelline", do compositor francês Paul de Senneville. Essa música me desestrutura, assim como as outras composições do artista e somada a emoção de ver minha colega tocar com tudo o que eu sabia que ela já havia passado deixei a lágrima cair.
E a minha Quinta da Saudade hoje vai dividir uma outra música de Senneville: "Mariage d'Amour", a última música que aprendi a tocar no piano antes de fechá-lo para sempre.
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