Siyahamba pode ser encontrada nesse álbum, disponível nas plataformas de streaming
Foto: Reprodução capa
Foi um momento muito complicado para uma menina de 19 anos que já dava aulas em duas escolas (consideradas as melhores da cidade).
Fiquei em absoluta tristeza, faltava algo pra mim. Foi quando em fevereiro de 2001 fui ao teste do TUMC (Teatro da Universidade de Mogi das Cruzes) e tive uma ideia do que aconteceria ali: o grupo era incrível, de vanguarda, "arretado" mesmo. Mas o diretor era claro quanto ao corpo a serviço do ator. Se o texto pedisse nudez, era preciso seguir adiante. Não tinha nada contra a nudez alheia, mas a minha me incomodava. Na terça teria um teste do Coral da Universidade, conhecido no Estado de São Paulo por suas belíssimas apresentações de cunho filantrópico e por receber pessoas da comunidade sem distinção. No primeiro ensaio que fui como ouvinte fiquei encantada com uma música chamada de Negro Spiritual (ouvi de olhos fechados e pareciam anjos cantando palavras africanas).
Depois de um dia inteiro trabalhando fui para o teste: teria de acompanhar a escala musical num vocalize. Vi pessoas reprovando na minha frente, e pensei : se eu reprovar posso ficar como ouvinte, já estou satisfeita.
Na minha vez segui as notas tocadas no piano pela maestrina com muita atenção. Ouvi de volta um :"excelente, você já está no coro, no grupo das sopranos".
Pra alguma coisa minha voz de "taquara rachada" serviria (rs).
Ali me encontrei: pessoas que eram parecidas comigo, pensavam como eu pensava, tinham o mesmo amor que eu pela música. Era a patinha feia se encontrando com os seus. E ali me tratavam como cisne.
Foram 5 anos juntos e com eles aprendi o significado do verbo RESPEITAR.
Respeitar as raças : éramos todos iguais, embora timbres e tons diversos que eram responsáveis pela beleza do coro.
Respeitar as diferentes culturas: tínhamos aulas sobre a origem das canções, sobre os povos e suas raízes.
Respeitar todos credos e suas manifestações : cantávamos músicas de diferentes religiões e cada uma tinha uma beleza.
E foi ali que conheci "Siyahamba", um blues cantado pelo povo Zulu, do Sul da África que se tornou popular nas igrejas evangélicas da América do Norte nos anos 1990, que fala sobre estar "marchando na luz de Deus". A canção também é considerada de protesto e em alguns eventos que trazem como tema o apartheid é cantada como "we are standing in the light of peace" - permanecemos na luz da paz.
É sob a paz da luz de Deus que está o jovem congolense Moïse Kabagambe espancado até a morte, aqui no Rio de Janeiro.
É pra ele e para todos os estrangeiros vítimas de xenofobia e violência que dedico minha Quinta da Saudade com esta apresentação do Coral da Universidade de Mogi das Cruzes do ano de 2004. Ah...estou aí no meio.
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