Já contei numa quinta da saudade sobre minha viagem para Porto Seguro. Além de dançar muito, aproveitei para conhecer os ritmos e instrumentos tocados pelos músicos que ali conheci. Aprendi a tocar atabaque, afoxé, agogô e bongô. Mas meu foco mesmo era o berimbau.
Queria muito aprender a tocar já que muitas vezes no caminho de volta pra casa passava pela praça da Telefônica ou a a praça da matriz e via os alunos do mestre Rosa da academia Baraúna jogando capoeira com as palmas acompanhando o coro de " Paranauê, paranauê, paraná..."
O som do berimbau me seduzia e muitas vezes ficava ali acompanhando o espetáculo. Precisava aprender, pois na banda de Luiz Maurício tinha um músico que o fazia com maestria e eu babava.
Chegando em Porto Seguro fui fazer meu laboratório musical: me meti nas rodas de capoeira e os músicos solícitos me ensinaram a tocar. Na passarela do álcool ao invés de me render às batidas doces fui aprender o berimbau. Não é fácil. Um trabalho de coordenação motora e ritmo : articular ao mesmo tempo a baqueta, o caxixi e a pedra é um tanto engenhoso. Mas a gente quando quer aprende.
Comprei meu berimbau: de madeira clara e com as cores da Jamaica. Era lindo e valeu todo o trabalho de esperar por ele na esteira do aeroporto.
Quando cheguei em Mogi, desci com o instrumento e um primo que foi me buscar com meu pai disse:
" Tati, só podia ser você mesmo pra aparecer com um berimbau..." e caiu na gargalhada.
Arrumei dois pregos e coloquei meu berimbau na parede do meu quarto: era o meu santuário, uma decoração bem hippie. Minha colcha de sol, lua e estrelas, as almofadas também. Livros espalhados, meu som, uma tv de caixa de madeira (típica dos anos 70), no teto estrelas fluorescentes e na porta de entrada um sino dos ventos. Tinha meu incenso ao lado da caixa de brincos de pedras e cristais. No armário potinhos de filmes fotográficos com areia das praias onde ia ou de onde pedia para trazerem pra mim -mania estranha, mas eu tinha. No quadro de cortiça lembretes de provas, poemas, fotos de amigos, familiares e do Lulu, claro.
Meu berimbau "pleno" junto de meu gato siamês cuidava de tudo enquanto eu estava no colégio. Até que um dia um mosquito bem diferente, todo laranja, verde, furta-cor resolveu entrar na cabaça e botar seus ovos. No susto vi o pó escorrer na parede e após os apelos desesperados de minha mãe o instrumento foi para o lixo.
Ao menos tive um gosto: aprendi a tocar a introdução de " La Danza del Tezcatlipoca Rojo " , música que o percussionista argentino Ramiro Musotto apresentava nos shows do Lulu. Nascido na Argentina mas radicado no Brasil desde os anos 80, o músico era apaixonado (assim como eu) pelos ritmos afro-baianos e os trazia para sua "praia" que era a música eletrônica.
Infelizmente partiu aos 45 anos em decorrência de um câncer mas deixou álbuns como "Sudaka" "Civilizacao y Barbarye ". E hoje minha saudade vai para 1997 quando conheci "La Danza del Tezcatlipoca Rojo", e a percussão de Ramiro...
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