Pular para o conteúdo principal

Quinta da Saudade : Deixar o sol entrar na voz de Adriana Maciel

Adriana Maciel uma de minhas referências vocais
Foto encarte CD: Tatiana Valente 


No meio da pandemia recebi uma mensagem de uma amiga dos tempos de colégio e um print de seu aplicativo com uma música de Vítor Ramil.

"Tati eu me lembro que você amava essa música e vivia ouvindo mas não era esse cantor, era uma moça?", me indagou.

Semana passada foi a vez de uma de minhas irmãs me perguntar como era o nome da moça que cantava "Grama Verde" .

"Além de você. Claro", disse rindo.

Acho deixei todo mundo  doido com a canção interpretada pela cantora Adriana Maciel. A música tocava na novela Corpo Dourado exibida pela Rede Globo em 1998. Minha identificação com a cantora e compositora foi imediata: acho que o timbre vocal ou um resgate do que eu ouvia na infância uma vez que a também flautista tinha sido fada do menestrel Oswaldo Montenegro. Se não me falha a memória a voz dela está nos vocais da música "Drops de Hortelã" e "Criaturas da Noite". 

E em "Grama Verde", canção do compositor  gaúcho Vitor Ramil era muito interessante observar a voz doce, mas ao mesmo tempo de uma firmeza que fascinava meus ouvidos. Achava lindo os arranjos que tinham um quê de música árabe . E  marcante o casamento de sua voz com o saxofone de Milton Guedes, parceiro de música e vida : um verdadeiro encontro de almas.

Eu que só sabia alguns acordes básicos do violão passava o dia inteiro tocando essa música. Ia em Ré Maior; Mi Maior com sétima no baixo e  Sol Maior (com Sol, claro).

 Ninguém aguentava me ouvir mais. O tom era ideal para Maciel na minha voz não . Mas a música era linda e merecia ser tocada. Confirmem vocês a beleza em forma de música...


Alguns anos depois estava na biblioteca da faculdade quando meu telefone tocou e era meu oráculo musical me perguntando como eu estava e me provocando : " precisa ouvir o CD novo da Adriana Maciel. Você vai gostar muito, eu tenho certeza".

Quando alguém me fala você "precisa" ouvir algo é como se eu recebesse um desafio ou uma missão. E esse "precisar ouvir" me causa uma curiosidade infinita. E o  meu OM conhecia bem meu gosto musical embora o dele fosse bem diferente, diria que o avesso.

Com os livros nos braços voltei pra casa caminhando, sentindo o vento frio da noite pelas ruas de Mogi com o "precisa ouvir" na cabeça. Gostava de andar sozinha (só minha) e aproveitava esse momento para refletir sobre  os acontecimentos do dia, sobre a vida,  e seguia  admirando a lua que parecia imensa por causa da minha miopia. 

Algum tempo  depois uma colega de sala me ofereceu uma carona e passamos no supermercado para que pudesse pegar seu carro e me deixar em casa. Uma explicação: os carros deixados na frente da universidade tinham seus aparelhos de cd roubados, então, muitos alunos estacionavam seus carros no  shopping ou neste hipermercado. Ela foi comprar algo para comer e eu corri para ver  a sessão dos CDs. O primeiro da fila de MPB era "Sozinha Minha". Estava me esperando.

Assim que cheguei em casa o coloquei em meu discman fui surpreendida pelos arranjos intrigantes da primeira música, de autoria de Lobão. Era ela novamente com sua doce voz mas desta vez cortante como uma faca afiada. Logo em seguida uma viagem com cara de música indiana me pedia para "Deixar o Sol Entrar" numa música de Thedy Corrêa. E dali por diante  ela me "encantava" com compositores como Paulinho Moska, Chico César; Carlos Careqa; Cris Braun; André Estrella; Newton Carneiro; André Gomes; Celso Fonseca e Vitor Ramil. Aliás as músicas do irmão de Kleiton e Kledir parecem que foram feitas sob medida para a voz de Adriana. As outras cantoras que me perdoem mas só gosto na voz dela.

Ouvindo faixa por faixa do álbum entendi o porquê de minha identificação: estavam ali músicos que já admirava. Celso Fonseca; Milton Guedes; Sacha Amback  (que também o produziu); Marcelo Costa; Ramiro Mussoto; Paulinho Moska; Marcos Suzano e Christiaan Oyens. De fato eu precisava ouvir.

E é engraçado a atemporalidade de uma obra. Naquela época as músicas diziam muito sobre mim. Com aquela idade, aquela vivência. Hoje, ouvindo- quase 20 anos depois - as músicas continuam fazendo sentido . Mas agora de um modo diferente, mais claro.

 Adriana é sem dúvidas uma das minhas grandes referências  femininas. Comanda a Numa Editora  e traz livros com muitas músicas e ótimas histórias para seus leitores. Ontem foi seu aniversário e eu quem peço o presente: "canta pra gente?"

Minha Quinta da Saudade vai dividir com vocês a minha xodó deste álbum, uma canção de João Nabuco que me representa : " Meio da Rua".







Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Djavan e Eles

Pétala - dia de celebrar o cantor e compositor muso deste blog e de muitos outros poetas e escritores Foto: Tati Valente Dia de Djavanear o que há de bom. Os leitores do Falando em Sol já estão cansados de saber o apreço que tenho pela obra do alagoano Djavan Caetano Vianna, e que todo ano, esta data aqui é celebrada em forma de palavras. O que posso fazer, se Djavan "invade e fim"? Para comemorar seu 76º aniversário, selecionei cinco momentos em que ele dividiu cena com outros nomes da música popular brasileira. O resultado: um oceano de beleza. Tudo começou aqui. Este foi o meu primeiro contato com Djavan e tenho a certeza que de toda uma geração que nasceu nos anos 1980. Ele é Superfantástico! Edgard Poças...obrigada por isso... Azul é linda, amo ouvir e cantar até cansar...  Com Gal e Djavan então...o céu não perde o azul nunca... Esse vídeo foi em um Som Brasil, no ano de 1994. Desculpem, posso até parecer monotemática, mas Amor de Índio é linda. Mais linda ainda com est...

Quinta da Saudade : Barracão de Zinco

Véspera de Natal e dia da famosa quinta da saudade. E a data esse ano pede (deveria pedir sempre) reflexões sobre nossas atitudes e o que podemos fazer para melhorar, evoluir. Especialmente num ano de tantas perdas, em que muitas vezes tivemos de abrir mão de estar com quem amamos para preservá-los.  E Natal para mim, desde a infância teve uma atmosfera mágica : desde o decorar a casa, até acreditar no Papai Noel e esperar pela meia-noite sempre foi muito aguardado, e ainda é. Mas o papo aqui é música, e vou contar a história de uma serenata que me lembro ter participado ainda criança (década de 80)  lá no bairro do Embaú, em Cachoeira Paulista, no Vale do Paraíba. Todos os anos nos reuníamos entre familiares e amigos e o samba era o ritmo que fazia a trilha sonora das festas. Ali tocavam Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Originais do Samba, Beth Carvalho, Clara Nunes, Almir Guineto, Martinho da Vila e assim a noite corria. Uma tia avó, chamada Cândida (Vó Dolinha para nós), g...

Bituca é Nosso!

Cara Academia do Grammy. Fica aqui nossa indignação pela forma como nosso Milton Nascimento foi recebido no evento de ontem. Sem mais, Tatiana Valente, editora responsável pelo Falando Em Sol.