O que a obra de Jean - Michel Basquiat teria em comum com a cantora, compositora e produtora cultural mogiana Valéria Custódio?
O artista, que morreu precocemente aos 30 anos de idade em decorrência de uma overdose trazia em suas obras com traços primitivos o retrato fiel da comunidade negra e latina de Nova Iorque. Filho de pai haitiano-americano e de mãe de ascendência porto-riquenha deixou a vida nas ruas e alcançou o sucesso, se tornando o artista plástico negro mais valorizado no mundo sem nunca ter cursado uma escola de arte. Só cursou a escola da vida.
É impossível não se impressionar com as denúncias em seus quadros de estilo expressionista, assim como diz a música "Basquiat" presente no EP Miragem, lançado por Valéria Custódio em outubro de 2022.
E trazer a tona a realidade das mulheres pretas e retratar a cultura de nosso país é o mote da obra da artista que em 2020 teve de readaptar a turnê de seu álbum "Púrpura" para a realidade da pandemia do Coronavírus. Os shows ganharam o formato digital e sua desenvoltura e competência lhe renderam o Prêmio Jovem da Música Mogiana. Já com o single "Flores Pretas" em parceria com Thiago Costa ganhou o 6º Festival da Canção de Mogi das Cruzes que recebeu canções de todo país.
A jovem de 27 anos começou na música ainda na infância tendo como referências Marisa Monte, Nina Simone, Lauryn Hill, Sandra de Sá e Sade e traz em canções como "Odoyá" e " Água pra se beber" todo balanço da música afro-brasileira e faz de Miragem uma deliciosa mistura de jazz com MPB tão impressionante como uma obra de Basquiat.
É ela a entrevistada do Falando em Sol de hoje.
Tatiana Valente
F.S - Como a música entrou na sua vida?
Desde cedo, por influência da família que sempre consumiu muita música brasileira dentro de casa, na adolescência me apaixonei pelas composições da Marisa Monte, artista que admiro a obra e foi uma das minhas referências no começo de carreira. Com o começo da minha juventude descobri o Jazz e artistas musicais diversos que surgem ao redor do mundo a cada dia.
FS - Quais suas memórias afetivas musicais? Quando e como começou a cantar profissionalmente?
Quintal de vó, família reunida pra comemorar algum aniversário ou final de ano, muita música brasileira como samba eMPB tocando no rádio. As memórias afetivas mais fortes que tenho vem por meio da minha família e as celebrações que aconteciam nela. No ano de 2016 com o projeto ¨Sambrasil¨ que reverenciava grandes compositores e compositoras do samba.
F.S- O teu trabalho tem muito de representatividade. Você já sofreu algum tipo de discriminação?
Para mim o papel de um artista negro é o mesmo de um advogado negro ou de um professor negro, o meu trabalho aborda essa questão da luta racial porque não poderia ser e nem deve ser diferente. O povo preto sofre com a discriminação a cada dia, como uma mulher negra também sou um alvo dessa ideia imatura que assola a humanidade, mas luto contra isso com as minhas forças e a minha música
F.S - Qual a importância da música pra dar voz aos artistas negros? Miragem tem muitos elementos da percussão afro-brasileira. Como foi a concepção do trabalho?
A concepção do disco ¨Miragem¨ foi durante o momento mais truculento da pandemia. Em processo de isolamento (tive o privilégio de ficar em casa trabalhando) pude olhar pra dentro de mim mesma e buscar esse autoconhecimento que desejava há muito tempo, assim surgiram diversas canções desse disco e também a concepção e referências artísticas. A música conta histórias e faz parte dela, ela representa um tempo e ajuda a narrar uma década, século falar sobre os costumes de um país, a música é um veículo que nos permite acessar memórias e lembranças diversas, diversos artistas pretos nos presenteiam diariamente com a sua arte, sendo famosos ou não.
F.S - Uma mulher negra entregou a faixa para o presidente. A nossa Ministra da Cultura também é negra. Qual a importância destas mulheres na luta contra o preconceito?
Estamos vivendo um momento histórico, todos, todas e todes já notaram isso. A representatividade dessas mulheres não é somente para a comunidade preta, mas sim o começo de uma reparação histórica neste país que foi construído pelas mãos de pessoas negras escravas. Viver no mesmo tempo em que essas pessoas estão ocupando lugares tão importantes na sociedade brasileira, não refletirá somente aqui e neste momento, mas sim no mundo todo e nas gerações futuras. Desejo sabedoria e coletividade para todas as mulheres pretas que assumiram de forma tão necessária seus cargos, nos dando o respiro de esperança e humanidade que a anos estávamos procurando, e que elas olhem para as outras profissionais pretas que habitam esse país e gerem renda e trabalho para cada uma delas e para todos os cidadãos brasileiros.
F.S - Qual o seu maior sonho?
Sou uma pessoa que sonha muito e corre atrás para realizar. Mas o maior sonho ainda não posso dizer (risos)
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