Pular para o conteúdo principal

Quinta da Saudade: " O amor é um grande laço..."


Faltando um Pedaço - canção de Djavan lançada no ano de 1981 fala as contradições do amor: laço para uma armadilha
Fotos: Tatiana Valente


Vinte e sete de janeiro foi dia de "Djavanear". 
Peço desculpas para vocês, pois não consegui escrever nada. Passei parte da manhã ouvindo Djavan e vendo as homenagens que surgiam de todos os lados. Sou "Djafã" desde a infância e já contei diversas vezes aqui como ele tem a capacidade de me fazer "viajar" com suas canções. De como meus amigos me definem com uma música dele, e que uma fã descobriu que ele tem cheiro de limão. Ah Djavan, um dia ainda quero sentir teu cheiro. Como sinto suas canções, bem aqui no meu coração. Pensei no que iria escrever, mas uma nebulosa textual me invadiu. Não saía nada, nenhuma frase ou palavra. Faltava em mim um pedaço.
No fim da tarde fui com meus pais para o sítio onde mora meu tio e onde passei minhas férias na infância e na adolescência . Ali,  enquanto fotografava o jardim de minha avó com as rosas que teimaram em resistir, mesmo após 31 anos de sua partida, pensava na letra de Pétala : "O amor invade e fim". E fim.  Até que uma chuva durante o pôr do sol me interrompeu os pensamentos com as gotas douradas caindo na terra, como um anúncio de que viria então, uma iluminação.
Sentada na varanda olhei para  a casa onde vivia minha tia avó Francisca, nossa Tia Chica. Já muito idosa passava as tardes sentada em sua "varandinha", olhando para a roça e para a mangueira ali de frente. Tinha uma memória incrível para fatos históricos e gostava muito de "prosear" com seus sobrinhos. Mas para nós meninas, tinha um conselho que dava com muita verdade: " Filha, não casa. O casamento é um laço do diabo".
Ouvia aquilo e achava graça. Ela falava com tanta sabedoria que até parecia uma personagem saída do livro de Guimarães Rosa. Pequena, sempre com o lenço amarrado na cabeça e na pele as marcas de quem viveu a vida sofrida  do plantio e só na maturidade pode viver na cidade. Eu me questionava,  com suas  palavras martelando em minha cabeça " um laço do diabo". Mas por que?
Já era adolescente e já tinha como verdade absoluta a  música de Nascimento  e  Brant que denomina o amor  como" laço que não escraviza". Mas por que casamento, a união de duas pessoas por amor seria laço do "tinhoso", segundo minha tia avó?
Nada como o tempo. Quando jovens somos tão tolos. A vida me mostrou que o amor para ser laço precisa ser livre. É uma permanência por vontade e não por imposição.
Se aprisiona não é laço, é nó. Se te censura não é laço, é nó. Se te proíbe não é laço, é nó. Se te impede de sorrir não é laço, é nó. Se te diminui não é laço, é nó. Se te afasta de seus amigos e familiares, não é laço, é nó. Se te força a presença não é laço, é nó.  Se não apoia seus sonhos não é laço, é nó. Se te controla financeiramente não é laço, é nó. Se te ameaça não é laço, é nó. Se não te aceita como é não é laço, é nó. Se te tira a vontade de viver não é laço, é nó. Se te sufoca não é laço, é nó dos bravos.
 Daí entendi o significado de "laço do diabo". É quando o amor se apresenta em forma de laço para te atar com um nó. Minha tia estava coberta de  razão.
O amor contraditório, que se torna um passo pra uma armadilha, e deixa no coração de quem ama a falta de um pedaço já tinha sido cantada por Djavan, responsável por toda essa reflexão de um sábado de verão.
E é "Faltando um Pedaço", lançada no ano de 1981 no álbum "Seduzir" que minha Quinta da Saudade vai dividir com vocês...







 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Djavan e Eles

Pétala - dia de celebrar o cantor e compositor muso deste blog e de muitos outros poetas e escritores Foto: Tati Valente Dia de Djavanear o que há de bom. Os leitores do Falando em Sol já estão cansados de saber o apreço que tenho pela obra do alagoano Djavan Caetano Vianna, e que todo ano, esta data aqui é celebrada em forma de palavras. O que posso fazer, se Djavan "invade e fim"? Para comemorar seu 76º aniversário, selecionei cinco momentos em que ele dividiu cena com outros nomes da música popular brasileira. O resultado: um oceano de beleza. Tudo começou aqui. Este foi o meu primeiro contato com Djavan e tenho a certeza que de toda uma geração que nasceu nos anos 1980. Ele é Superfantástico! Edgard Poças...obrigada por isso... Azul é linda, amo ouvir e cantar até cansar...  Com Gal e Djavan então...o céu não perde o azul nunca... Esse vídeo foi em um Som Brasil, no ano de 1994. Desculpem, posso até parecer monotemática, mas Amor de Índio é linda. Mais linda ainda com est...

Quinta da Saudade : Barracão de Zinco

Véspera de Natal e dia da famosa quinta da saudade. E a data esse ano pede (deveria pedir sempre) reflexões sobre nossas atitudes e o que podemos fazer para melhorar, evoluir. Especialmente num ano de tantas perdas, em que muitas vezes tivemos de abrir mão de estar com quem amamos para preservá-los.  E Natal para mim, desde a infância teve uma atmosfera mágica : desde o decorar a casa, até acreditar no Papai Noel e esperar pela meia-noite sempre foi muito aguardado, e ainda é. Mas o papo aqui é música, e vou contar a história de uma serenata que me lembro ter participado ainda criança (década de 80)  lá no bairro do Embaú, em Cachoeira Paulista, no Vale do Paraíba. Todos os anos nos reuníamos entre familiares e amigos e o samba era o ritmo que fazia a trilha sonora das festas. Ali tocavam Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Originais do Samba, Beth Carvalho, Clara Nunes, Almir Guineto, Martinho da Vila e assim a noite corria. Uma tia avó, chamada Cândida (Vó Dolinha para nós), g...

Bituca é Nosso!

Cara Academia do Grammy. Fica aqui nossa indignação pela forma como nosso Milton Nascimento foi recebido no evento de ontem. Sem mais, Tatiana Valente, editora responsável pelo Falando Em Sol.