Três mulheres. três histórias diferentes. Numa faixa etária que multiplica três por dez. Três musicistas com seus três instrumentos musicais. Porém o objetivo delas é um só: por meio da arte criar espaços para mais mulheres na música e em todos os trabalhos, para gerar união e conexão entre elas. De posicionamento firme, o grupo Souela defende a ancestralidade, a raiz, as marcas e histórias das mulheres pretas e esta é a temática de "Minha Pele Preta, single lançado no dia três -sim, mais um três- de maio.
Natural de Limeira a banda nasceu em 2014 do encontro de Gabriela Reis (voz e guitarra), Larissa Feóla (contrabaixo) e Larissa Ladeia (bateria e Percussão), e traz em suas canções uma mistura marcante de MPB, Soul, ritmos africanos e latinos por meio de arranjos criados especialmente por elas e pode ser conferido no primeiro EP, "Alma de Mulher", lançado em 2019, no Dia Internacional das Mulheres disponível em todas as plataformas, além de outros singles com canções de ritmos envolventes.
Sonhando com um mundo onde as mulheres possam ser respeitadas, ter equidade de direitos e decisão sobre as próprias vidas, as integrantes da Souela deram uma entrevista para o Falando em Sol contando suas trajetórias e experiências.
(Tatiana Valente)
F.S -Como vocês se conheceram e formaram a Souela?
Eu, Larissa Féola conheci a Larissa Ladeia em uma ONG onde
eu trabalhava, ela fazia aula de música lá, mas só fomos nos reencontrar e
formar a Souela alguns anos depois e aí depois de uns 2 anos a Gabi entrou na
banda, ela e a Larissa Ladeia fizeram faculdade de música juntas e desde então
a 10 anos estamos juntas criando música, sendo resistência e levando nossa
mensagem através da arte.
Larissa Ladeia- No meu caso eu nem sabia o que era bullying,
eu sou gêmea e nós sempre fomos as “nerds ” da escola, éramos conhecidas como
as gêmeas da escola e nerds, na época eu não entendia nada, pra mim eu ia pra
estudar mesmo. Mas hoje percebo o quanto a cobrança excessiva para ser boa
aluna, boa filha, trouxeram dificuldades em socialização, alta cobrança em ser
bom em todas as áreas.
Além da questão de ter sido uma criança menina, fora do padrão da magreza, essa questão sempre me acompanhou, quando você é criança as vezes você até esquece a chacota alheia, mas a informação de ser “feia, fora do padrão ” é uma questão que você carrega durante muitos anos até entender que está tudo bem ser você, ter o seu corpo.
Larissa Féola - Na escola sofri bastante primeiro por ser
uma pessoa de 1,50 de altura, isso me gerava diversos apelidos e piadinhas, que
na época eu até levava numa boa e nem sabia ao certo o que era isso de
bullying, depois sofri também por não ser aquelas meninas padrões, me achava
inferior, achava que não era bonita, sofria também por não ser de uma família
padrão, na época me lembro em ser um das poucas pessoas da minha sala que os
pais eram separados, e a verdade que sempre fui criada pela minha mãe, meu pai
não foi presente, então isso na época de escola é muito difícil de lidar, mas
vejo que hoje isso me formou, me fez ser
a mulher que sou e principalmente me fez desenvolver minha arte, minha música,
são experiências que ajudam a se ver no mundo, a querer falar o que precisa ou
escrever músicas sobre.
Gabriela Reis - Na escola não, mas fora dela sim.
Uma vez eu estava indo pra escola que era perto da minha casa, então fui a pé. E passando na frente do tiro de guerra, um dos meninos que estavam lá dentro falou pra mim: e cabelo Bombril. Isso me marcou muito pois era a semana em que eu decidi soltar meu cabelo, e eu vivia de tranças e lógico fiquei mal, tinha 10 anos. Mas quando entrei na escola chorando eu encontrei minha amigas e lembro que elas me levaram no banheiro e me empoderaram naquele momento dizendo que meu cabelo era bonito e tal. Foi um momento não muito legal, mas não deixei de soltar o cabelo só por conta desse episódio.
FS- E ao longo destes
10 anos, sofreram algum tipo de preconceito?
Larissa Ladeia -
Estar na Souela a 10 anos é crescer, aprender e amadurecer junto de outras
mulheres a 10 anos, neste período, tive o grande prazer de ser apoiada, no meu
processo de entender a minha sexualidade. O preconceito ele passou por mim de
formas bem sutis, por conta do meu enredo social, o que de fato sou muito
grata, contudo viver no interior paulista é um eterno renovar-se. Ainda existem
momentos que é bom manter o silêncio do que escancarar as suas opiniões.
Larissa Féola - Quando falamos em ser mulheres na música já
enfrentamos diversos desafios, desde de técnico de som que falta com respeito,
que não te ouve, a pessoas que às vezes descredibiliza seu trabalho só por ser
mulher , em 10 anos passamos por muitas histórias que dariam um livro, acredito
que ainda hoje passamos por algumas situações, mas fomos ficando calejadas e
aprendendo a se defender de forma inteligente , as vezes o fato de subir no
palco e tocar seu instrumento já vem como uma resposta a esses preconceitos.
Gabriela Reis - Sim, por ser mulher. Aconteceram episódios
que me fizeram sentir impotente por as
pessoas não respeitarem o que estamos falando, ou não entender. Teve uma
passagem de som que fizemos que o
técnico não respeitou os nossos pedidos de regulagem de som que fez a gente
sentir que não sabiamos o que estávamos fazendo.
FS- Como nasceu Minha
Pele Preta?
Como todas as músicas da Souela, Minha pele Preta nasceu de
conversas nossas, de vivências, do que vemos na sociedade e sentimos a
necessidade de falar.
Falar sobre Mulheres pretas sempre foi uma pauta que a
Souela defende por ter a Gabi nossa Cantora como uma mulher preta, já trouxemos
esse tema em outras composições e Minha Pele Preta veio de forma mais madura
pra começar a celebrar esses 10 anos, vai ser o primeiro lançamento desse ano,
onde vamos falar da mulher preta e suas raízes, sua história, sua
ancestralidade e além da música que traz uma pegada bem black music com
elementos afros, vamos lançar um clipe no dia 17/05 com 5 mulheres preta representando
Anastácia, Dandara, Carolina Maria de Jesus e Mariele Franco, uma produção
incrível que vem pra ilustrar tudo o que a letra e música de Minha Pele Preta
Trás.
FS- Como vocês definem
a "alma" da Souela?
Souela vem de alma , vamos dizer que abrasileiramos , mas
nosso primeiro EP se chama Alma de Mulher em referência ao nosso nome.
A Alma da Souela é poder criar espaços para mais mulheres na
música e em todos os trabalhos, é unir e conectar mulheres, é quando a gente
pode através do nosso trabalho contratar uma musicista , uma roadie, uma
design, uma produtora musical, é quando realmente fazemos o nosso propósito
acontecer e quando isso muda a vida dessas mulheres e nesses 10 anos temos
certeza que muitos mulheres se transformaram pelo nosso trabalho.
F.S- Como você gostaria
que fosse o mundo para as mulheres?
Larissa Ladeia - Que a fala fosse respeitada, e tivéssemos as mesmas condições e oportunidades. Que a segurança e a saúde pública fosse uma pauta mais abordada em relação às necessidades da mulher.
Larissa Féola - Que pudéssemos existir sem medo de morrer só por ser mulher , que tivéssemos os mesmo privilégios dos homens e que as pautas relacionadas a saúde da mulher não fosse sempre um tabu, onde então julgando e decidindo o que é melhor por nossos corpos, nossas vidas e escolhas.
Gabriela Reis - Um mundo com mais respeito, colocando- se mais no lugar do outro. Que possamos andar na rua sem ter medo que algo aconteça. Que possamos ser mais ouvidas, sem rastejar por isso.
Amei demais essa entrevista!!! A Tati arrasa!! 🤩
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