A pequena, de mente criativa e borbulhante ainda na escola recebeu em forma de tema de redação seu primeiro dilema : " O que você quer ser quando crescer?". Uma pergunta um tanto complexa para quem queria tudo. Amava dançar, queria ser dançarina. Via na Tv a atriz e cantora Rita Pavone, logo queria cantar e interpretar como a italiana. Como grande parte das crianças gostava de dar vida aos desenhos com as mais diversas cores, queria desenhar . De uma única coisa tinha certeza: queria ser artista.
Na juventude após "trancar" a matrícula do curso de História na UERJ e participar de um workshop com Regina Casé e Luís Fernando Guimarães, integrantes da Asdrúbal Trouxe o Trombone, passou a integrar a banda Espírito da Coisa conhecida pela irreverência nas canções: quem viveu os anos 1980 com toda certeza cantarolou " mamãe, eu acho que estou ligeiramente grávida". No fim dessa década deu vida à Xixa, fofíssima lagarta do filme Super Xuxa contra o Baixo Astral e se mudou para a Califórnia onde vive desde então. De 2012 a 2018 produziu os shows "Brazilian Heart Celebration" onde homenageou grandes nomes da música brasileira e atualmente administra a Brazilian Heart Art, sua marca de roupas, calçados, cartões e acessórios e lançou o delicioso livro de poesias - em português e inglês- "Diário da Moraes", onde divide suas experiências e reflexões em forma de poemas.
A menina que um dia sonhava em ser tudo e conseguiu se mostrar em diversas versões dela mesmo conversou via What's App com o Falando em Sol e relembrou sua trajetória nas artes. Confiram na entrevista de hoje.
(Tatiana Valente)
FS- Na sua primeira redação escolar você escreveu que queria ser três coisas. Como era a menina Katia?e lembra de seu primeiro contato com a arte?
A Katinha era meiga, adorava dançar e se inspirou vendo a cantora italiana Rita Pavone na televisão quando era pequerrucha. Adorava as aulas de artesanato na escola e acreditava em tudo e em todos. A arte visual entrou na minha vida bem mais tarde mas sempre gostei de desenhar e colorir. A primeira música que cantei com meu tio Mauro me acompanhando no violão foi Teletema do Antonio Adolfo que eu tive a honra de entrevistar no Brazilian Heart LIVE no Instagram durante a pandemia.
F.S- O Espírito da Coisa tinha um caráter contestador. Como foi fazer parte desse grupo num período em que o país se refazia de anos de Ditadura militar ?
Eu acho que a minha experiência com o Espírito da Coisa caiu como uma luva porque eu havia trancado o curso de História na UERJ depois que participei de um workshop de teatro com a Regina Casé e o Luís Fernando Guimarães do Asdrubal Trouxe o Trombone. A vontade de expressar minha opinião ganhou força quando fui convidada para fazer parte do grupo em 1982. A ideia do projeto misturava teatro e músicas que eram críticas sociais, políticas e religiosas. As letras do Cláudio Barreto e do Paulo Guerra eram super sarcásticas e me apresentaram a um outro mundo. Eu cresci numa família não politizada, então a faculdade e o Espírito foram fundamentais pra eu aprofundar a minha visão sobre o Brasil e a abertura política. Eu acho que a nova geração não estava acostumada com os temas das músicas, mas o senso de humor, a teatralidade e a nova onda do rock ajudaram. Na realidade, a música Ligeiramente Grávida não era um rock originalmente. Era um foxtrote mas com certeza mudou pra rock pra entrar no mercado. Muita gente comenta sobre a Blitz porque também tínhamos duas meninas cantando mas o assunto era bem diferente.
F.S - Qual a importância do teatro na sua formação?
Foi muito importante. Um amigo me levou pra assistir dois shows muito importantes na minha vida no início dos anos 80: Elis Regina no Canecão e o Asdrubal Trouxe o Trombone no Teatro Ipanema. Fiquei tão apaixonada pela peça que comentei comigo mesma: Se isso é teatro, é isso que eu quero fazer na vida. Costumo dizer que todo mundo devia fazer teatro pra se conhecer. Com ele eu expandi a visão de mim mesma, da sociedade, do mundo. Eu fiquei mais extrovertida, além de aprender a projetar a voz em tipos diferentes de palco, harmonizar com os outros cantores, como muitas outras coisas relacionadas com fazer parte de um espetáculo.
F.S - Como surgiu o convite para interpretar a Xixa no Super Xuxa Contra o Baixo Astral ?
Minha amiga Denise Prado que trabalhava na produção do Espírito me indicou para a diretora do filme Anna Penido. Fui conversar com ela na agência que estava produzindo o filme. Ela gostou do meu astral e da voz que improvisei na hora pra Xixa. Eu amei fazer a voz da Xixa e até hoje recebo mensagens de brasileiros que amam o personagem.
F.S - Como foi sua mudança pra Califórnia? Como é ser uma artista brasileira nos Estados Unidos?
Eu estava casada com o músico e ator Mário Costa (Manhas e Manias, Banda Saga) e ele queria estudar música na Grove School of Music em Los Angeles. Na época nossas bandas tinham acabado e criamos o Katita e Marito, um pocket show. Viemos pra Califórnia em 1990 e eu comecei a cantar com uma banda de músicos americanos tocando música brasileira. Mário e eu formamos a banda The Rio Thing e começamos a nos apresentar em vários bares, clubes e festas particulares. A primeira banda tinha americano, peruano, alemão, francês, uma mistureba. Tocávamos Gil, Caetano, Djavan, Lulu, Chico, músicas do Mário e lambada também. Na época existiam muitos clubes oferecendo música ao vivo de todas as culturas. Eu aprendi muito sobre como me comunicar com o meu inglês que não era dos melhores, com quem trabalhar, como me locomover, quanto cobrar, etc. Vai conhecendo pessoas que vão trocando informações sobre onde morar, onde achar comida que vc gosta, etc.
Depois que eu e Mário nos separamos eu formei minha banda chamada Brasil Nuts, que mudou depois pra Sambaguru com quem gravei 5 CDs com músicas autorais. Nos shows juntei música, literatura e dança. O que tinha escrito na redação escolar quando era criança.
F.S - Em Brazilian Heart Celebration você homenageou vários artistas brasileiros? Quais suas referências musicais?
A mais forte referência é a Elis Regina. Por isso o primeiro show foi em homenagem a ela. Teve uma exposição de desenhos fotográficos do artista Jorge Vismara, decoração com mobiles feitos com as capas dos discos da Elis pelo Brad Austin, um vídeo editado pelo Jorge com cenas de shows dela e um show ao vivo com algumas canções que escolhi no Centro Cultural Brasil Brasil. Eu cresci escutando música popular na radio. Minha mãe adorava música clássica também. Meus pais tocavam Noel Rosa, Elizeth Cardoso, Roberto Carlos, Altemar Dutra, etc. Depois descobri samba, serestas, chorinho em Vila Isabel, Alcione, Clara Nunes, Rita Lee, João Bosco, Milton Nascimento, Janis Joplin, John Lennon, Stevie Wonder, Gil, Caetano, Maria Bethânia trazendo literatura pro palco, Ivan Lins, Gal, etc. As letras sempre foram importantes pra mim. Adoro pesquisar, escrever letra de música, coloborar com outros artistas. Mulheres compositoras que me inspiraram? Fátima Guedes, Luli & Lucina, Joyce, Ana Terra, Rita Lee, Dona Ivone Lara…Muita gente boa! A poesia da Joni Mitchell é maravilhosa. Quantas vieram depois dela!
F.S- E a escritora, como nasceu?
Cresci com Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Adélia Prado e as letras maravilhosas de uma geração poética ímpar. Aos 15 anos escrevi uma conto chamado Onze e de lá pra cá não parei mais. Na adolescência gostava de escrever letras para músicas instrumentais. Escrevi poesia para uma coletânea na faculdade. Depois ensaiei vários livrinhos caseiros no Brasil e aqui na Califórnia. Estava ensaiando. Poesias, letras de música, crônicas, contos, roteiro de show.
F.S- O que te inspira?
Tudo. Nunca sei o que vai me fazer escrever. Eu sigo a intuição. Sou curiosa. Tem sempre alguma coisa me instigando, me fazendo pensar, sonhar, indagar, aprender…Lembro que quando viajei em turnê cantando o grupo de dança Viver Com Brasil daqui, eu gostava de sentar na primeira poltrona perto do motorista pra prestar atenção em tudo que via na estrada. Pelo menos duas dessas crônicas vão estar no próximo livro.
F.S - Além de administrar a Brazilian Heart Art quais projetos tem para 2024?
Tenho um projeto chamado Brazilian Heart Experience que é uma sessão de 45 minutos de engajamento cultural para expandir o conhecimento sobre o que é ser um brasileiro. Inclui falar português, dançar samba, sentir ritmos, compartilhar poesia, desenhar, falar do Brasil. Me convidaram para apresentar essa idéia num lugar lindo nesse verão.
Estou desenvolvendo um projeto literário com meu marido e também organizando, escolhendo as poesias, crônicas de viagem e contos para o próximo livro.
Em junho vou participar de uma exposição junto com outros artistas na galeria comunitária de Thousand Oaks. Escolhi uma pintura/colagem chamada Amor que gostaria de te mandar pra vc compartilhar no seu Blog. E definitivamente quero continuar colaborando com outros compositores. Minha última colaboração foi com a compositora/cantora Cecilia Noel. Ela musicou minha poesia e usou minha arte visual no video que já está com mais de 600 mil vizualizações do YouTube.(https://www.youtube.com/watch?v=yV95NimbW9E)
Obrigada, senhorita Valente! Sigamos embelezando o mundo e criando novos caminhos. ☀️🌸
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