"MÃAAAAAAE. TEM UMA BARATA NO SEU QUARTO!!!!!!!", gritava meu caçula enquanto corria para a cozinha e subia em cima da cadeira.
Estava encaixada em meu buraco no sofá, totalmente imersa na minha leitura atual, "Bem-Comportadas", de Elise Loehnen, um estudo detalhado sobre os sete pecados capitais e o preço que nós mulheres pagamos para provar nossos valores. Até pensei em deixar a bicha quieta até encontrar a janela e voar, mas se tem uma coisa que odeio é imaginar que vou dormir num lugar que tem uma barata. Na hora me lembrei de Clarice Lispector - aniversariante desta semana- com suas inquietações e reflexões sobre uma barata em Paixão Segundo G.H. Me imaginei, como no livro engolindo a barata, o que no meu caso seria por acidente, e achei melhor levantar e resolver a questão. Vá que a maluca resolvesse dormir do meu ladinho, atraída pelo cheiro do meu creme de macadâmia (Natura, me patrocina, rs).
Valente que sou, caminhei até meu quarto. Da porta a avistei. Era das grandes. Atirei a sandália que estava no meu pé e ela correu para debaixo da cama. Fui para o outro lado da cama e atirei o tênis do meu filho mais velho. Ela migrou para o banheiro se escondendo atrás de um armário. Que raiva. Fui até a cozinha e peguei o SBP. Voltei ao banheiro e comecei a pensar:
" Que bicho é esse que nem a bomba atômica destrói? Como pode ter virado inspiração para um momento de um dos meus livros favoritos ? E musa de música! Até uma barata é musa! Tudo bem que na música do Alexandre Pires ela teria um fim, mas virou musa e hit", tudo isso passava na minha cabeça enquanto a aguardava sair detrás do armário, dando batidas com a lata do inseticida.
E quando meus pensamentos estavam longe, ela surgiu plena, vestida com sua casca marrom quase bordô e antenas para o alto como se me encarasse e dissesse: "viu, sou musa deles e você quem é", me causando um momento de crise existencial, só para me provocar e distrair.
Voltei em mim e apertei com força o jato do produto, teoricamente feito para exterminá-la, mas o que realmente fez foi pinta-la. A bicha ficou branquinha e num ato raivoso voou para o alto do azulejo. Era voadora, para piorar um pouco. Dei um mini "piti" xingando o produto, minhas amigas me disseram que depois ela apareceria morta. Mas eu não queria o depois. Queria que matasse na hora. Poxa!
Gritei para que os meninos me trouxessem uma vassoura. Sim, nessa hora eles estavam na sala, em cima do sofá, aguardando a guerreira Xena aqui salvá-los da vilã. Luiz jogou a vassoura na porta e saiu gritando. Uma cena de guerra, para animar o fim do domingo tedioso.
Dei uma vassourada na barata, que num ato de ódio voou em minha direção. Dei outra vassourada com a bonita no ar, e ela caiu no chão. O que "La Kukaratcha" não poderia contar é com minha sandália de borracha, de tamanho 39/40. Pisei nela com gosto. Esmaguei, xinguei e exteriorizei toda raiva guardada nesse ano. Descontei alguns outros anos também, só pra não perder a oportunidade.
Depois de morta, pensei que essa barata poderia ter sido uma aparição de Gregor Samsa, personagem de "A Metamorfose", de Kafka. Ele estaria ali, sem as perninhas, com as antenas tortas e agonizando no chão do meu banheiro. Recolhi a asquerosa com a pá e dei a ela um fim digno, no jardim de casa, para que se tornasse adubo para minhas rosas. Recebi aplausos dos meninos, e me senti a mulher mais macha deste mundo. A heroína deles.
E depois dessa aventura toda, minha Quinta da Saudade vai dividir com vocês "Uma barata chamada Kafka", de uma banda que fez muito sucesso nos anos 80 e 90 chamada Inimigos do Rei. Era integrante dela o cantor e compositor Paulinho Moska. A canção, super irreverente, foi lançada no ano de 1989, e conquistou a criançada, como esta que vos escreve.
P.S 1: Moska. Não tenha medo de mim. Só mato baratas... (risos)
P.S 2: Meninos da Vagabundo Sagrado...nem todas mulheres têm medo de baratas.
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