A maçã - considerada fruto proibido, foi tema de canção composta por Raul Seixas, Paulo Coelho e Marcelo Motta
Foto: Tatiana Valente
Há alguns meses enquanto tomava meu café preto na cozinha escutei um barulhão e vi uma sombra passar pela janela. Corri para o quintal , pois parecia a queda de algum animal. Me deparei com uma maritaca filhote, ainda aprendendo a voar. Me aproximei da bichinha, tentei pegá-la, me bicou e logo em seguida voou para o muro e de lá para algum outro lugar. Livre. Assim são os pássaros. Mas para que eu pudesse ter essa compreensão de que as aves foram criadas para poder voar para onde bem entendessem sofri muito.
Quem me conhece sabe que desde menina sou louca por animais. Um dia contarei para vocês aqui a história de cada um deles, devo ter lá com São Francisco de Assis um crédito especial por tantas vezes que acolhi bichinhos, e briguei por eles. Se passo na rua e mexo com um bicho ele me segue. O último foi o gato de algumas casas abaixo da minha, me seguiu, descobriu onde era minha casa e ficava miando no meu portão para que pudesse entrar. Passava o dia aqui, no meu colo com a pata pousada no computador enquanto escrevia, ou no jardim, caçando bichos, e dei a ele o nome de Orion, o deus da caça. Lá, em sua residência oficial se chama Mel Gibson, tem lindos olhos claros, e a dona, achando graça da vida dupla do bichano me avisava de sua chegada, com fotos mostrando que estava tudo bem. Os gatos, assim como as aves, são livres. Eles escolhem onde e com quem querem conviver. Seguem o que Drummond disse no poema " amor é dado de graça". E assim deveria ser nas relações humanas.
Quando tinha uns oito anos, era apaixonada pelos periquitos do mato que via no sítio de minha avó. Alguns eram domesticados e viviam perfeitamente em suas gaiolas. Até que levei um deles para minha casa em Mogi. Era verdinho, com olhos redondinhos e pretos, mas toda vez que tentávamos alimentar ele procurava fugir, aquela vida ali preso, não era de sua natureza . Um dia ao chegar da escola recebi de minha mãe a notícia de que ele tinha fugido. O verdinho tinha ido embora. Chorei, berrei e solucei. Eu o amava tanto, mas aquilo não foi o suficiente para que ficasse ali. Acho que foi tão doído quanto um término de relação, a primeira rejeição. Com todo amor que eu dava a ele, preferiu partir.
Liguei para meu pai em seu trabalho, o seu amigo, meu querido "Tio Henrique"- aquele que fazia meus gostos ao som de Rita Lee"- foi quem atendeu o telefone e me disse, com seu jeitão de herói:
"Brina, se acalme, pare de chorar. O Tio Henrique aqui vai dar um jeito nisso", confiante.
Duas horas depois chegava junto de meu pai, com uma gaiola e um casal de periquitos, um verde e outro azul. Dei a um o nome de Henrique e a fêmea o nome da noiva dele na época. Eles viveram ali unidos até a morte. Nunca tentaram fugir, afinal era da essência deles viverem presos e juntos. Cada um tem uma forma de vivenciar o amor. Tudo é questão de essência.
Para mim ficou a lição. Alguns animais não nasceram para viver presos em gaiolas. Se existe amor verdadeiro, existe respeito pela essência. O amor não pode ser colocado em gaiolas. É "estado de graça", e " foge a dicionários". Se o pássaro é livre e decide pousar do teu lado, é escolha, amor de fato. Ninguém é feliz vivendo numa prisão. Difícil entender isso, mas necessário para não se deixar sufocar pelo tal do ciúme, que corrói e destrói todo sentimento bom.
E foi a liberdade no amor, desprovida de egos, foi o tema da música "A Maçã", composição de Raul Seixas, Paulo Coelho e Marcelo Motta, lançada no ano de 1975 no álbum Novo Aeon.
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