Semana passada recebi um pedido inusitado: "Tati me ajuda a montar um repertório novo, com canções que marcaram as décadas."
Montar um repertório é um momento muito delicioso, ao menos para mim. Não é só escolher canções aleatórias, do tipo: "gosto de cantar, vai essa". Aprecio ter uma linha de raciocínio, um conceito para a apresentação, uma história para se contar. Daí, comecei a pensar em canções que pudessem descrever o "ser mulher " ao longo das décadas.
Respondi para minha amiga : " canta Maldito Costume, a gente sempre cantava". Ela não se lembrava mais da cifra, que não está disponível no Cifra Club. Peguei no meu "parça", o violão e busquei nele os acordes que se adequavam à melodia que saía de minha voz. Desde muito nova, essa era a forma que encontrava de me virar no piano. O tal "tirar de ouvido", era o meu jeito de fugir da partitura, depois no violão era a forma de me virar, quando as cifras das revistas não tinham a canção que eu queria cantar.
,Maldito Costume, tinha apenas dois acordes, o que para uma menina como eu era na época que nunca tinha feito aulas de violão, conseguia tocar. Gravei o vídeo e mandei pra minha amiga no tom da voz dela, e continuei aqui buscando o tom mais confortável para a minha. Como diz minha amiga e professora Aline Chiaradia: "busque o tom da sua voz de brilho.
No meio da cantoria parei para prestar atenção nos versos da música que dizem: " A mulher quando gosta, deve ser feliz e atacar seu bem". Pra uma canção da década de 1920, é a ousadia em forma de letra, ainda mais vinda de um homem desta época. Mas quem seria o autor de tais versos?
José Barbosa da Silva, o Sinhô, nasceu no Rio Janeiro em 1888, e lá faleceu aos 41 anos, muito jovem, mas com um cancioneiro que marcou a história da música brasileira. Tanto, que é conhecido por muitos, como o "Pai do Samba". E você que está aqui lendo este texto, com toda certeza já cantarolou "Jura, jura pelo senhor..,", ou " Gosto que me enrosco, de ouvir dizer que a parte mais fraca é a mulher! Mas, o homem com toda a fortaleza, desce da nobreza e faz o que ela quer..." - deu pra perceber a visão que ele tinha de uma mulher? Surpreendente para a época.
Pois são apenas duas de tantas outras músicas compostas por ele, padrinho musical de artistas como Mário Reis, Francisco Alves e Aracy Cortes. Como em sua música, foi "embriagado pelo capitoso vinho do amor", e, aos 17 anos se casou um uma portuguesa com quem teve três filhos. Teve em sua vida outros amores, por quem jurou de coração por inúmeras vezes. Mas sua grande paixão mesmo era a música : frequentador da roda de samba de Tia Ciata teve como parceiros musicais Germano Lopes da Silva, João da Mata, e Donga.
Com o último, citado ali, teve um pequeno desgosto. Tomou um susto quando soube que "Pelo telefone" teria sido registrada por Donga como dele com Mauro de Almeida, quando na verdade a música, considerada um dos primeiros sambas cariocas, era cantada por todos na casa de Ciata como "O Roceiro". E olha, que nessa época nem tinha Internet pra se plagiar e deixar a impunidade rolar.
Mas esta é uma outra história. Hoje trago para vocês, na minha quinta da saudade, "Maldito Costume", uma música de Sinhô, gravada por Ceumar, Luiz Henrique e Henrique Chaves. Para quem não me conhece, sou a que canta nesse vídeo.
P.S para os meninos: aprendam alguma coisa com o Sinhô.
P.S para as meninas: já sabem..." a mulher quando gosta, deve ser feliz e atacar seu bem. Ai o amor ..." (risos)
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